Como Empreender em Portugal?

Empreendedorismo

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Entrevista à Jornalista, Fernanda Silva Teixeira, do Órgão de Comunicação Semanário Vida Económica a propósito da minha intervenção na AEP subordinada ao tema “ Como Empreender em Portugal? “

 

1. Tendo em conta o atual contexto económico, de particular adversidade, e onde se sucedem as notícias de insolvências e despedimentos, até que ponto a aposta no empreendedorismo é um desafio acrescido?

De facto o período a que estamos a viver é de uma enorme instabilidade mas ao mesmo tempo também é propício a novas oportunidades. Nesse sentido enquanto a economia está a mudar e a sociedade altera os seus padrões de compra muitas empresas estão e vão certamente fechar portas, quer seja por inadaptação, por quebra nas vendas, por dívidas de clientes ou muitos outros motivos. No entanto outras (existentes e novas) terão de descobrir que devem formatar os seus produtos e serviços às novas necessidades e às novas referências de valores, que podem usar novos modelos de negócio mais resistentes a tempos conturbados e que podem encontrar na ausência dos que definham um novo mercado de oportunidades. Não digo que seja fácil identificar o que está a mudar e como responder a isso, mas reconheço que agentes inovadores podem ver neste momento novas oportunidades que os convidam a empreender.

De um modo mais lato, a sociedade floresce quando as pessoas pensam de forma empreendedora. Com efeito, mais problemas serão resolvidos e solucionados mais depressa se cada um de nós redescobrir os nossos instintos empreendedores ou o mesmo será dizer actuando de forma confiante, expedita, ambiciosa, adaptável e em permanente interacção com as redes de contactos que vamos construindo no decorrer das nossas actividades.

 

2. Ainda assim, o saldo entre empresas constituídas e dissolvidas foi positivo em 2012…

Apesar de reconhecer que os portugueses são tão, ou mais, empreendedores que os franceses, italianos ou qualquer outro povo europeu, como o demonstram os milhares de pequenos empresários que sustentam com as suas micro-empresas a maior parte do emprego existente no nosso País, tenho de ser realista e admitir que o seu futuro está muito em risco perante a actual recessão económica e financeira que estamos a viver.

De facto Portugal sempre teve um número elevado de empresas, nomeadamente muitas lojas de conveniência, cabeleireiros, gabinetes de consultores entre muitas outras actividades, impulsionadas por empreendedores que sempre me mereceram o maior respeito e consideração. O que não se tem “produzido” o suficiente são empresas inovadoras que crescem rapidamente e ambicionem o mercado global.

É por isso que tenho defendido que Portugal precisa de Empreendedores de “alto rendimento” que possam criar e fazer crescer empresas, também elas de alto rendimento, uma vez que criam mais postos de trabalho (grande parte destes qualificados), acrescentam valor à economia, ambicionam o mercado global, exportam ou substituem importações, ou seja, criam riqueza para a Sociedade em que se inserem.

Até porque as condições para a emergência desta tipologia de empreendedores existem, atualmente, no nosso País, em quantidade razoável: Universidades de Excelência, quadros qualificados e competitivos comparativamente ao resto da Europa, infra-estruturas adequadas, administração pública relativamente desburocratizada, incubadoras de empresas e mais recentemente uma oferta de capital – encontram-se disponíveis para investimento até dezembro de 2013 mais de 250 milhões de euros conforme se pode visualizar em http://www.pofc.qren.pt/areas-do-compete/financiamento-e-capital-de-risco – por parte de investidores especializados nas fases emergentes de criação de empresas “de alto rendimento”, usualmente denominadas “start-ups”.

 

3.Qual tem sido o papel dos Business Angels na promoção do empreendedorismo em Portugal?

Desenvolver uma cultura e um sistema de empreendedorismo nacional é um fenómeno sistémico. Utiliza-se inclusivamente, cada vez mais, a designação de Ecossistema Empreendedor porque se interligam múltiplos factores e Instituições que vão desde as Agências e Organismos do Governo, as Incubadoras, Aceleradoras, Parques Tecnológicos, Universidades, até aos instrumentos de financiamento nos quais os Business Angels se incluem.

Naturalmente que fazendo parte desse Ecossistema a Comunidade Portuguesa de Business Angel tem vindo a desempenhar de forma bastante pro-activa um papel deveras importante na dinamização de uma nova geração de empreendedores, através do apport da sua experiência empresarial, tecnológica e das suas redes de contactos de maneira a assegurar o êxito do projecto no qual investiu inclusivamente o seu próprio dinheiro.

De facto também no nosso País os Business Angels estão dispostos a investir em negócios inovadores possuindo a particularidade de adicionalmente afectarem o seu tempo que lhes permite assim serem investidores activos. Esta perspectiva empresarial traduz-se assim num valioso apport no desenvolvimento do negócio ainda que em muitas ocasiões a interacção com os empreendedores com características mais científicas, inovadoras ou mesmo do responsável pela ideia original possa não ser a mais pacífica…

A prova desta realidade é que nos últimos dois anos mais de 200 investidores, através de mais de 50 sociedades veículo, efectuaram 69 investimentos no valor global de 9.2 Milhões de euros contribuindo assim para a criação de quase seis dezenas de empresas com elevado potencial de crescimento e valorização.

Contudo estas são as boas notícias. As más notícias são as de que dos muitos projectos que se apresentam às redes de Business Angels, muitos dos quais acabam inclusivamente por não obter qualquer investimento pois não se encontram devidamente estruturados, são empresas ou projectos que demonstram ser inviáveis fazendo com que os promotores se vejam obrigados a deixar os seus sonhos empreendedores e alguns deles a regressar ao mercado de trabalho.

Esta capacidade de escrutínio que os Business Angels possuem, fruto da sua experiência empresarial, torna-se assim uma mais-valia muito importante na mitigação dos riscos associados ao consumo indevido de recursos, quer estes sejam medidos em termos financeiros ou de afectação de tempo ou até mesmo de questões de cariz comportamental ou emocional nada fáceis de ultrapassar nomeadamente por jovens empreendedores que normalmente se encontram perante o seu primeiro desafio empresarial.

É por isso que um dos aspectos mais importantes da actividade dos Business Angels no Ecossistema Empreendedor nacional tem passado pelo apoio na (i) procura, identificação, assessoria e preparação de bons projectos de investimento, (ii) realização de acções de formação para empreendedores e na divulgação activa do conceito de BA junto dos actores locais e (iii) no estabelecimento de mecanismos de “matching” e de encontro, tanto presencial como através de plataformas digitais, da oferta e da procura que tenham em conta os requisitos de tomadas de participação em novos projectos empresariais;

 

4. A obtenção de financiamento continua a ser o grande desafio com que se deparam os empreendedores? Como é possível ultrapassar este obstáculo?

Neste momento o que falta sobretudo aos nossos empreendedores é um mercado interno saudável ao qual vender. Com a quebra dos índices de consumo torna-se difícil sustentar a actividade, principalmente de uma “start-up” que muita das vezes tenta lançar no mercado novos produtos e serviços, pelo que se torna essencial olhar para o mercado global desde que o projecto começa a ser gerado. Apesar dessa perspectiva ser a solução mais indicada para muitas actividades (nem todas são exportáveis) a mesma requer muitas vezes algum investimento físico (feiras, comunicação, novos parceiros) que carece de tempo e dinheiro.

Essa pode ser uma limitação mas há também janelas abertas para progressos nessa área. Por exemplo, hoje é mais fácil criar equipas internacionais que trabalham em rede (na “cloud”) e por video-conferência. Hoje é também mais fácil ter o nome da empresa divulgado globalmente em directórios gratuitos e em websites da especialidade, assim como é mais fácil encontrar e contactar directamente alguém do outro lado do mundo através das redes profissionais. Resta muito trabalho pelo meio a fazer mas com criatividade é possível alterar o modelo “padrão” e encontrar novas formas de globalizar.

Em todo o caso importa ter presente que, com as restrições existentes no acesso ao crédito e à ausência do sector do capital de risco formal nos negócios emergentes, reconhecemos que os Business Angels têm sobre si cada vez mais responsabilidade no financiamento desta tipologia de negócios. No entanto é importante afirmar que os Business Angels são muito selectivos nas suas escolhas e que o seu envolvimento não é compatível com todos os tipos de negócios. Vai continuar a ser necessário crédito, garantia mútua, leasing entre outras fontes para o financiamento integral ou complementar de novos negócios. Como já vimos, estamos num Ecossistema e a responsabilidade – bem como os benefícios – têm de ser naturalmente partilhados por todos.

 

5. Que tipo de negócios estão a ser criados nesta conjuntura e em que sectores residem as melhores oportunidades de investimento?

De uma forma geral os Business Angels e o Venture Capital investem em pessoas, não em tecnologia ou mesmo geografias. Nesse sentido um empreendedor, bem preparado e totalmente comprometido com o projecto, com um argumento bem fundamentado sobre como pretende resolver um problema de um determinado mercado captará certamente a atenção dos investidores.

Claro que a ideia é importante, assim como o tamanho do mercado, os rendimentos e os custos, mas mais importante que esses factores é o empreendedor e a Equipa que a vai implementar.

Um líder fantástico com um mau conceito vai de alguma maneira tornar essa iniciativa num sucesso, mas um mau líder com o melhor conceito resultará quase sempre em falha. O investidor está a prestar tanta atenção ao empreendedor enquanto individuo como à ideia; está à procura de um empreendedor em quem possa confiar o seu dinheiro ganho arduamente. Assim, a maneira como o empreendedor apresenta a sua ideia ou inspirará confiança ou a destruirá.

De maneira a responder à questão lanço um desafio aos empreendedores, que nos estão a ler, para me acompanharem no seguinte raciocínio “ À medida que a população do mundo cresce para nove mil milhões, não estão de acordo que contribuiríamos imenso para as necessidades que essa comunidade vai possuir se identificássemos oportunidades de investimento na ciência alimentar, na biomedicina e/ou nas tecnologias verdes? “

Se têm projectos devidamente estruturados, nomeadamente nas áreas citadas, de que estão à espera para os apresentar aos Business Angels que se encontram na área geográfica da vossa residência?

 

6.Para terminar, que argumentos utilizaria para demonstrar a um potencial empreendedor que vale a pena arriscar em Portugal?

Num País com o consumo em queda, aumento de impostos, ineficiência dos tribunais, ausência de investimentos e incerteza sobre a manutenção da paz social, não é de estranhar que muitos daqueles que possuam as capacidades empresariais primem pela ausência de confiança preferindo, infelizmente, abandonar o País à procura de outros ciclos económicos mais consentâneos com as suas ambições.

Apesar desta dura realidade, continuo a acreditar que aqueles que decidirem ficar e que se encontrem bem preparados e motivados, terão a confiança para perspectivar que o nosso ciclo se aproxima do seu mínimo e que, em breve, começaremos a recuperar de maneira a poderem beneficiar das excelentes condições existentes actualmente em Portugal, para se tornarem empreendedores de “alto rendimento”.

Da minha parte, tenho boas notícias para motivar os que se encontram nessa situação ou, no mínimo, para que possam dar o benefício da dúvida ao desafio que vos estou a lançar com a mensagem desta minha resposta.

De facto, nos últimos vinte e quatro meses, apesar de se terem sido realizados 69 investimentos, por parte de Business Angels – empresários e gestores de empresas que aplicam o seu próprio dinheiro e experiência profissional em empresas de elevado potencial de crescimento – no valor global de 9,2 milhões de euros em empreendedores que se espera venham a ser considerados de “alto rendimento” ainda se encontram disponíveis 32.8 milhões de euros… para investir até Junho de 2014 uma vez que acreditamos que iremos ver surgir, também em Portugal, empresas que, amanhã, se tornem uma referência mundial.

Recomendo, no entanto, aos potenciais empreendedores, que se preparem para reunir com os investidores, apresentando uma atitude optimista, não esperando que estes comecem a encontrar falhas na vossa apresentação com todos os “e se”. Em vez disso, tomem a liderança e antes que os investidores possam perguntar, digam-lhes que embora não antecipem problemas se encontram preparados, demonstrando-o de forma objectiva, para lidar com eles…se estes aparecerem!

 


Licenciado e Mestre em Gestão de Empresas. Presidente da Gesbanha, S.A., especialista em capital de risco e empreendedorismo, investidor particular ("business angels"). Director da EBAN e da WBAA

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