Crise: Prioridades para Portugal

Luís Mira Amaral

Presidente do Conselho Consultivo do Fórum para a Competitividade

 

A recessão das economias ocidentais (designadamente da Espanha) vem afectar as nossas exportações. A actual crise internacional vem assim agravar e explicitar de forma mais evidente a insustentabilidade da nossa trajectória, até porque ela vem tornar mais difícil o financiamento externo à economia portuguesa, ou seja, a captação de poupança externa longa, necessária para cobrir os cerca de 10% a mais do nosso consumo em relação ao nosso produto. Por via disso o crédito bancário será mais escasso. Os bancos portugueses são os que estão mais expostos na zona euro ao financiamento nos mercados grossistas, dado que o nosso défice de poupança não permite o funding da nossa banca, através dos depósitos dos agentes económicos. Com efeito, um défice externo é no fundo um défice de poupança nacional face ao investimento e ao crédito que o financia!

 

Na actual conjuntura, as preocupações com a sustentação da procura interna e com o combate ao desemprego, não podem esquecer a restrição externa e a sustentabilidade das finanças públicas, pois que este problema está longe de estar resolvido.

 

Uma vez que o BCE ainda tem margem de manobra para descer taxas de juro (ao contrário do FED) e uma vez que a fraqueza da procura mundial deverá manter preços mais baixos de energia, nos juros e na energia já teremos um alívio para os portugueses.

 

Quanto à política fiscal, se a ideia fosse baixar impostos às famílias para sustentar o consumo (embora parte dele venha de importações), tal só valerá a pena nas famílias de menor rendimentos, pois nas de maior rendimento essa redução de impostos levaria a um aumento da poupança e não a um aumento do consumo. Na frente fiscal, o que se deve então fazer é reduzir a carga fiscal e parafiscal às empresas de bens transaccionáveis para, por essa via, estimular as exportações de que precisamos como de pão para a boca para suavizar a restrição externa.

 

Para a sustentação de procura interna e de apoio ao emprego temos ainda o investimento público, onde importa projectos que simultaneamente sustentem a procura e o emprego no curto-prazo e aumentem a taxa de crescimento potencial da economia a médio-longo prazo. Nesta perspectiva inserem-se: (1) As pequenas obras como recuperação de escolas e troços de ligação (“last mile”) entre as auto-estradas existentes e centros urbanos. Essas pequenas obras criam mais emprego e oportunidades para as PME’s da construção civil que grandes investimentos, tipo TGV; (2) Barragens, investimentos na eficiência energética, nas energias renováveis e nas redes digitais da nova geração.

 

Não se inserem claramente neste compromisso entre curto e longo prazo investimentos megalómanos em bens não transaccionáveis que têm forte conteúdo de importação, não darão um euro a mais nas exportações, não reduzirão custos de transacção e agravarão dramaticamente a prazo as nossas finanças públicas e o nosso endividamento externo, tais como:

– TGV Lisboa-Porto e auto-estradas ao lado doutras já existentes. Talvez que as dificuldades de financiamento travem esses projectos. Há males que vêm por bem…

 

A crise impõe assim uma redefinição das prioridades da nossa política económica no sentido das políticas públicas de apoio aos bens transaccionáveis, e do congelamento de projectos megalómanos nos bens não transaccionáveis que só iriam agravar a situação a prazo.

Se antes da crise, os decisores já valorizavam pouco o aumento da produtividade, a redução de custos e as politicas do lado da oferta (“supply-side policies”) há o risco agora, de se assistir a um “keynesianismos” insensato, gastando, à custa da “música” do investimento público, os nossos escassos recursos, reais ou alavancados no endividamento público, rapidamente em quantidade sem prioridades, em vez de serem afectados criteriosamente às prioridades das actividades mais produtivas.

 

Se isso acontecer, quando a crise acabar, ficaremos, ainda com pior afectação de recursos e portanto em muito pior situação!

in http://competitividade.com.sapo.pt/ 


Licenciado e Mestre em Gestão de Empresas. Presidente da Gesbanha, S.A., especialista em capital de risco e empreendedorismo, investidor particular ("business angels") e Presidente da FNABA (Federação Nacional de Associações de Business Angels). Director da EBAN e da WBAA

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